Na ânsia de exaltar os feitos de seu governo, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) parece ter entrado em rota de colisão com a realidade — ou, no mínimo, com a demografia mundial. Em entrevista concedida à TV Globo da Bahia, Lula afirmou que a transposição do Rio São Francisco levou água para “13 bilhões de pessoas”.
A cifra é espantosa — não pela grandiosidade da obra, mas porque representa quase o dobro da população do planeta Terra, hoje estimada em torno de 8 bilhões de habitantes. Se tomarmos a fala ao pé da letra, Lula não apenas resolveu o problema hídrico do semiárido nordestino, mas também garantiu água potável para Marte, Júpiter e talvez até alguma colônia em Andrômeda.
A fala se deu logo após outra estatística generosa: a de que o PT retirou 54 milhões de brasileiros da miséria. “Nós conseguimos tirar 54 milhões da miséria e colocar a comida na vida das pessoas. Você, Ricardo [apresentador da Globo], um dia vai conhecer o que é a transposição do São Francisco. Você vai conhecer que é a maior obra hídrica do mundo, se não é a primeira é a segunda", declarou o presidente, com a convicção de quem anuncia um feito inquestionável.
Não é de hoje que o marketing político tenta transformar exageros em feitos históricos. O problema é quando a retórica atropela os fatos de forma tão escancarada que beira o deboche com o público. Números inventados ou esticados ao absurdo revelam mais do que erros de fala: denunciam uma velha fórmula de propaganda onde o que importa não é o dado, mas o impacto da manchete.
A ponte invisível
No mesmo programa, Lula também falou sobre a famosa (e fantasiosa) ponte Salvador-Itaparica. “Finalmente saiu a ponte”, disse o presidente. A afirmação foi prontamente desmentida por quem vive a realidade baiana.
ACM Neto, ex-prefeito de Salvador, gravou um vídeo lembrando o óbvio: não há uma estaca sequer fincada. "O presidente disse que finalmente a ponte saiu. Mas presidente, saiu aonde? Saiu para quem? Porque o PT da Bahia prometeu a ponte em 2009, disse que iria inaugurá-la em 2013. De lá para cá, já se passaram 16 anos e ainda não há uma estaca sequer batida da ponte Salvador-Itaparica", declarou ele em vídeo.
Nesse ritmo, se depender das palavras do presidente, a ponte pode até já estar pronta — e conectando Salvador à China, se for seguir a lógica dos 13 bilhões.
Governar com palavras
O discurso do presidente mostra que, para o atual governo, basta dizer que está feito. Não importa se a ponte não existe ou se o número de beneficiados é fantasioso. O que vale é a narrativa — porque ela, diferente da infraestrutura, não precisa ser construída: basta ser falada.
Resta ao cidadão decidir se quer viver num país real ou no universo paralelo onde cabe 13 bilhões de pessoas e onde obras saem da boca para fora.
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